DESCONFIANÇA - Implosão do Futuro
Bastas vezes me interroguei sobre as razões que levam as pessoas a eleger candidatos cujo historial é de corrupção ou, no mínimo, muito pouco transparente. Entre as muitas razões, umas de raiz mais especulativa que outras, cheguei à conclusão que uma das principais, quiçá síntese de todas as outras, será a DESCONFIANÇA. Apesar do paradoxo, penso que é precisamente aí que se situa o cerne da questão ou, melhor dizendo, da decisão. A desconfiança em relação a toda a classe política conduz a que, numa decisão de grande racionalidade, se vote naquela pessoa, desde que tenha o mínimo de obra feita e apesar do aparente descrédito, que represente menor risco face ao desconhecido da mudança.
Ao contrário do que se pensa e diz, a decisão é puramente racional. Como existe uma identificação do trabalho dos políticos ao desejo de poder - formal e económico - e não ao desempenho de funções enquanto serviço, qualquer mudança comporta sempre um risco maior, «porque são todos iguais»! Por isso, mais vale jogar pelo seguro e não apostar no desconhecido. Além disso, para o menos conseguido existe sempre a desculpa do Estado central a quem se imputa muita da ineficiência. Esta forma de estar e de conduta é tanto mais perigosa quanto ela desacredita a democracia e deixa espaço a toda a espécie de atropelos dos detentores do poder. Como se chegou a este estado em que todos desconfiam de todos e em que existe um descrédito enorme nas instituições democráticas? A verdade é que aqueles que à partida teriam a responsabilidade de criar níveis de confiança cada vez maiores enveredaram por caminhos minados, criando uma teia de relações de grande promiscuidade entre vários poderes: político, empresarial, económico, comunicação... E daí retiraram dividendos hoje demasiado evidentes na nossa sociedade. Este comportamento teve como consequência um afastamento crescente das pessoas das instâncias de poder e um grau crescente de desconfiança em relação a essas mesmas instâncias e seus representantes. Se é verdade que a desconfiança é terrível para a economia, ela será ainda pior para a sociedade nas suas diversas vertentes, pois torna-se uma verdadeira armadilha capaz de implodir o futuro colectivo de todos os seus membros.
Ao contrário do senso comum, penso que os políticos devem ser bem remunerados no desempenho das suas funções, embora sempre de acordo com as disponibilidades do país e de uma forma bastante transparente. Não estarei de acordo com a concessão de mordomias e o aproveitamento do poder na criação de relações de dependência nada transparentes que apenas contribuem para um desconfiança crescente. O facto de terem desempenhado funções ao serviço do país não lhes dá o direito de adquirirem direitos diferentes dos outros cidadãos. A título de exemplo, não vejo - a não ser por insanidade intelectual - que os que desempenharam determinadas funções tenham direito a reformas, não raras vezes chorudas, com tempo de serviço muito aquém do definido na lei para todos os outros cidadãos. Não me questiono, e tão pouco é essa a questão, o peso dessas mordomias nas contas do estado, já que do meu ponto de vista se trata de uma questão de princípio e de equidade.
A verdade é que na sociedade portuguesa e nas elites representativas dos vários poderes, grassa grande imoralidade. Pior ainda, é que toda essa imoralidade, por não ser ilegal - nesse caso seria de âmbito criminal - é aceite como normal e com ela se convive com consciência perfeitamente tranquila. Confesso que há situações que, na minha ingenuidade e boa-fé, tenho grande dificuldade em compreender. Não consigo entender, por exemplo, como é que alguma gente consegue viver sem dormir?! Estou a falar a sério, basta olhar para a quantidade de Conselhos de Administração a que alguns pertencem - mesmo não sendo executivos - e o esforço a que provavelmente isso os obrigará, que dificilmente terão tempo para as necessidades básicas do comum dos mortais, quanto mais para perder tempo com uma noite descansada de um sono repousante. Não admira por isso que sejam tão bem pagos e sejam candidatos a reformas precoces e suculentas. Existe contudo uma pequenina coisa que escapa à minha pobre ignorância: por que razão são sempre tão bem remunerados se nem sempre as empresas têm uma rentabilidade que o justifique?!
Outro facto pouco entendível, e a sua compreensão bem jeito me daria - é como conseguem que o seu dia tenha mais de 24 horas. No que a este facto diz respeito sou bastante crítico, pois não deviam ser tão ciosos de tão grande descoberta, pois não apenas resolveriam o problema de gente como eu (sem tempo para o muito que gostaria de fazer), como contribuiriam para o aumento da produção do país, como ainda tão nobre descoberta lhes poderia valer, simultaneamente, vários Prémio Nobel: Economia, pelo aumento vertiginoso da produtividade; Física, pela dilatação do tempo sem alteração de períodos; Medicina, pela resistência do corpo humano. Admito contudo que o segredo seja de tal forma valioso que só o partilhem com os amigos, pois ao vulgarizar-se deixaria de produzir os efeitos requeridos. Gostaria, no entanto, de lhes fazer uma exigência apelando à sua boa-vontade, já que em democracia não fica bem proibir o bom funcionamento das leis do mercado. Não tenham a desvergonha de vir a público apontar soluções para tudo quanto cheira a crise, porque nós, pobres ignorantes desconhecedores do segredo, ficamos roídos de inveja, sobretudo porque somos nós os desgraçadamente penalizados pelas soluções que desenham.
Não é possível alguns continuarem a banquetear-se à mesa do contribuinte, excluindo do festim os que para ele contribuíram.
BASTA, porque o nosso segredo é a Indignação.
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