UM PRESIDENTE FORA DE TEMPO

Ao contrário do que parece ter acontecido à maioria dos comentadores e aos partidos da oposição, não me parece que o discurso do Presidente nas comemorações de Abril tenha causado qualquer surpresa. Sobretudo após o «acordo» com o governo na sequência da decisão do Tribunal Constitucional. Cavaco foge das crises e da instabilidade como o diabo foge da cruz. Além de essa característica não se enquadrar na forma como olha a sua função de presidente, também não faz parte do seu comportamento político ser causador, mesmo se indireto, de qualquer tipo de fractura. Acresce ainda o facto de Cavaco não possuir a estaleca política e a preparação mental para gerir situações de grande tensão. Não faz parte do seu ADN. Está muito mais próximo do tecnocrata e do técnico – vertente bem patente em muitos dos seus discursos – do que do político capaz de ler a realidade e, sobretudo, sobre ela refletir e gerir as consequências das suas decisões projetando-as no futuro. Não significa isto que não seja um político hábil, aliás a gestão da sua carreira política comprova-o, mas falta-lhe a cultura e a reflexão dos verdadeiros políticos, daqueles que assumem plenamente as suas decisões, mesmo correndo riscos, porque têm a capacidade de projetar no futuro a leitura que fazem da realidade. Essa característica, própria dos grandes líderes, que lhes permite gerir situações de fronteira (o lugar onde melhor se observam ambos os lados) sem perderem a perspectiva do futuro. Cavaco não é nada disso, nunca o foi e nunca o será.

Ao colar-se demasiado à política do atual governo, deslocando grande parte da responsabilidade do fracasso para a Europa, destruiu ele próprio, e ao contrário do que tem sido o seu discurso, qualquer alicerce que pudesse existir de pontes de diálogo. Apesar de ter apelado ao consenso – não poderia deixar de o fazer – Cavaco prefere a estabilidade de uma coligação moribunda do que o risco da instabilidade de um governo sem maioria, mesmo que tal facto possa representar uma melhoria para o País. Esse sua postura assenta, por um lado, na dificuldade de distanciamento da sua família política e, por outro, na sua incapacidade em gerar consensos e ser assertivo na afirmação de um pensamento político e numa estratégia para o País. Refugia-se com demasiada frequência em frases ("Eu bem avisei…”, “…, já várias vezes tenho dito…”) que mais não são que mera desculpa – nem sequer são justificação – da indecisão. E são muitas vezes proferidas fora de tempo, porque não assumiu o discurso na altura própria.

Definitivamente, este é um Presidente deslocado no tempo. Cavaco é, definitivamente e de forma clara, um Presidente fora do tempo que vivemos. Sem nunca ter sido o «meu Presidente», embora fosse o Presidente do meu País, tenho sérias dúvidas que continue a ser, para além do aspecto formal, o Presidente de um país que clama por alguém que oiça a sua voz e que aja de acordo com esse clamor.

Este não é definitivamente o Presidente deste País e, muito menos, do seu povo.

Sejam felizes em seara de gente.

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