O NÃO CONSENSO COMO VIA DE DIÁLOGO

Há já alguns anos, num dos encontros internacionais em que participei, um investigador francês da área da sociologia, ativista em programas de inclusão, defendia que mais do que os consensos teríamos que aprender a valorizar o não consenso – o “desconsenso”. Desde então, esta ideia subversiva tem-me acompanhado, embora sem perceber, até hoje, o seu verdadeiro alcance em termos de futuro, caso fôssemos capazes de a praticar nas diferentes situações do quotidiano. Dizia ele que as sociedades democráticas ao fazerem da arte do consenso um fundamento da própria democracia, acabaram por desvalorizar o essencial na evolução e aprofundamento das próprias democracias, ou seja, o diferente. Os consensos, na tentativa de inclusão, tendem a adulterar o que é radicalmente novo e diferente no outro. Existe uma espécie de aculturação ideológica, embora subtil, que não introduz qualquer elemento disruptivo, mas que, ao contrário, estabelece uma continuidade travestida de novidade. Esta valorização do consenso, diria mesmo hipervalorização, tem uma consequência bem mais penalizante para a evolução e amadurecimento das democracias: o ignorar do que de fundamental e inovador as minorias transportam. Mas é precisamente nesse património genético que reside o essencial do diálogo. Caso assim não seja, não existe um verdadeiro diálogo, mas apenas apropriação ou adulteração. Fica claro que o consenso não é, como admitido pelo senso comum, a cedência do mais forte (do poder) às exigências da parte mais fraca (minoritária), nem a apropriação por uma das partes – geralmente a mais forte – das ideias da outra.

O consenso procura-se no que cada uma das partes apresenta como inovador, diferente, alternativo – mesmo que a outra não esteja de acordo – e na procura de vias em que ambas as partes possam assumir em conjunto o radicalmente novo. Esta postura perante o outro implica sair da zona de conforto, mostrar disponibilidade, despir-se de ideias pré-concebidas e, finalmente, desnudar-se dos preconceitos em relação à outra parte. Não se trata apenas de encontrar pontes entre o que eu penso e o que o outro pensa, mas o construir algo radicalmente novo a partir das diferenças, daquilo que nos separa e do que de inovador cada um de nós transporta. Ou seja,, trata-se não de obter o consenso, mas de construir algo de novo a partir do não consenso. Aqui reside o caminho para o verdadeiro diálogo e respeito pelo outro, sobretudo quando o outro é minoria. Quanto ao resto é pura retórica e oportunismo intelectual, ideológico, cultural, político…

Estabelecer o diálogo com base no não consenso implica um longo e, por vezes, penoso caminho e uma longa aprendizagem que não tem qualquer semelhança com o que atualmente se passa na política, sendo válido para todos os quadrantes e não apenas nos mais evidentes, visíveis e mediáticos.

Ao contrário do que é ideia feita, o consenso, quando construído a partir do não consenso, introduz elementos disruptivos e pode ser profundamente inovador. A sociedade portuguesa – a sociedade europeia - necessita urgentemente de um verdadeiro diálogo que não se compadece com alguns arrufos oportunistas de muitos dos seus atores e agentes.

Procurem no outro o que ele tem de inovador e sejam felizes em seara de gente.

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