VIP's SOMOS TODOS NÓS

Não concebo, ao contrário de alguns (talvez muitos!), a existência de qualquer lista VIP da Autoridade Tributária, seja ele oficial ou oficiosa. A existência de uma qualquer lista deste tipo significa que há contribuintes que, apenas pelo facto de estarem mais expostos, merecem tratamento ou protecção especial da parte do Fisco. Ora, numa democracia não me parece que tal situação transparente e, muito menos justa. Se, por hipótese, uma tal lista existisse - infelizmente parece que existe mesmo- seria então natural, em nome da transparência, que se soubesse quem dela consta. Imaginem que um vosso vizinho, funcionário da Autoridade Tributária, que devido a alguns desentendimentos decidia revelar aos outros vizinhos toda a sua «ficha fiscal». Seria este facto menos grave do que se de facto se tratasse de uma pessoa pública? Não me parece que uma maior protecção dos contribuintes resida na criação de listas «VIP». Esta questão é grave porque, ao detectar-se tal necessidade, isso significa que no seio da própria Autoridade Tributária reina uma grande desconfiança e uma cultura de pouca responsabilidade. Além disso, este modus faciendi é bem próprio de sociedades procedimentais e excessivamente regulamentadas, ao contrário do que acontece em sociedades responsabilizantes, cujas regras apenas servem para balizar e não para regular ou proibir. Infelizmente, e esse é um factor impeditivo de mudança, Portugal é um país essencialmente procedimental, onde a cultura de responsabilidade está praticamente ausente. É também por essa razão que é falacioso falar em mérito, pois isso só tem sentido quando o exercício do poder e as relações que se estabelecem são baseadas em responsabilidade e não em procedimentos, regras ou leis. Talvez por isso gostemos tanto de legislar e tão pouco de implementar. Mas voltemos à dita lista VIP. Não concebo a existência de uma lista deste tipo, porque:
1. Qualquer cidadão deve ser tratado de forma igual pela Autoridade Tributária;
2. Qualquer funcionário, a partir do momento que aceita fazer parte de determinada entidade ou serviço, está obrigado ao sigilo profissional;
3. As regras devem ser simples e claras para todos os funcionários e quem tiver comportamentos desviantes deve ser responsabilizado e, se tal se justificar, sofrer as respectivas consequências;
4. Deve sempre prevalecer uma cultura de responsabilidade e não de controlo e desconfiança, embora se admita e tenha que existir mecanismos de alerta para detectar situações anómalas.
Para que exista uma cultura de responsabilidade, importa que os dirigentes sejam os primeiros a dar o exemplo, pois só assim ganham autoridade (não poder) para exigirem dos outros a mesma responsabilidade. Quando se sabe que a lealdade é qualidade que não abunda em muitos dos altos quadros do Estado - e a Ministra das Finanças é disso exemplo - custa a crer que algum dia seja possível construir essa cultura de responsabilidade. Aliás, este episódio é mais um, entre muitos outros, em que a responsabilidade política parece não existir e, pior que isso, é mesmo negada pelos titulares dos cargos. Não importa se o Secretário de Estado sabia ou não, embora eu não acredite, mas se ele continua ou não a ter autoridade perante os seus subordinados?! A verdade é que eu desconfio que nas esferas do poder, seja ele qual for, confunde-se poder com autoridade e, quando assim é, é a democracia que perde.
Sejam felizes em seara de gente.

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