NOTAS IMPROVISADAS

REFORMA DO ESTADO

Impressiona a nossa incapacidade para planearmos o futuro, no mínimo pelo tempo de uma geração. Significa que o legado que a outros deixamos é sempre fruto dos nossos próprios interesses e não em nome de um futuro que, sabendo não nos pertencer, acreditamos possível. Como pretendemos nós reformar o Estado se não sabemos o que pretendemos ser enquanto País ou que Sociedade pretendemos e estamos dispostos a construir? Pretender reformar o Estado como se de mera operação contabilística se tratasse, é revelador de incompetência, ignorância, impreparação e falta de cultura política e social. Todos concordamos que é necessário – mesmo imprescindível – reformar o Estado, mas para isso importa que estejamos de acordo sobre algumas questões prévias fundamentais. E isso exige um grande esforço de debate e de reflexão, confronto de ideias e de visões. Exige também grande honestidade da parte de todos os intervenientes e, sobretudo, a consciência de que estamos a lançar os alicerces de um futuro que a outros caberá construir. E não venham os «moralistas» de serviço, liberais ou outros, dizerem-nos, em nome de interesses que raramente ousam pronunciar, o que deve ou não ser feito, onde se deve ou não cortar, quando todos percebemos que mal alguém ouse atingir, mesmo se ao de leve, os seus interesses pessoais ou de corporação, logo se põem em bicos de pés.Olhando para as forças em contenda – políticas, sociais, corporativas, económicas, sindicais e outras – percebemos o quanto este país está fragmentado e o pouco solidário que é. Ninguém está disposto a ceder um milímetro que seja e, caso seja necessário ceder, que sejam os outros e não nós. Infelizmente, o resultado recai sempre sobre os mesmos: quando negativo sobre os mais fragilizados, quando positivo beneficia os mais abastados, os quais, além da abastança, detêm ainda o poder de decisão. Mas são muito solidários… Só que palavras leva-as o vento! A grande reforma do Estado seria passarmos de um Estado construído sobre regras, um Estado de procedimentos, para um Estado de responsabilidade. As regras e os procedimentos haverá sempre quem os pretenda fintar, enquanto a responsabilidade é uma atitude cultural e comportamental. Num Estado e numa Sociedade onde grassa a irresponsabilidade não haverá regra ou procedimento que resista à avidez dos interesses, sejam eles quais forem.

ASSIM NÃO HÁ JUSTIÇA QUE RESISTA!

A escolha de Franquelim Alves para Secretário de Estado, bem como as declarações de vários responsáveis políticos, incluindo neles o Primeiro Ministro, mostram o quanto os responsáveis políticos desvalorizam o caso BPN. O que está verdadeiramente em questão não é a competência ou responsabilidade do visado no caso BPN, mas a falta de ética e de transparência na nomeação. Acredito que a pessoa em questão seja competente e quanto à sua responsabilidade no caso BPN a outros caberá ajuizar, embora possa acrescentar que em determinadas situações é tão grave a omissão do crime e dos criminosos como a sua prática. No mínimo existe cumplicidade, havendo para tal sempre razões que possam justificar a atitude, apesar de inaceitável e condenável. A grande questão é saber se as pessoas que nos governam pautam os seus comportamentos por valores éticos ou se apenas lhes interessa os objetivos sem olharem a meios. Se assim for, é caso para dizer que não há justiça que resista. Quem faz tábua rasa de princípios básicos de uma boa governança não é gente que mereça a minha confiança, e isto nada tem a ver com eventuais erros, mas apenas com princípios. Quando alguém retira do currículo (e parece não ter sido o próprio) as referências que podem ser incómodas, o facto apenas revela, além de ingenuidade, uma grande falta de carácter, de transparência política e de ética. Pior ainda, revela o que de pior somos: o chico espertismo português sempre disposto a tentar enganar o outro para daí retirar proveito. E quando isto se passa ao nível da governação… estamos conversados.

JORNAL

PORQUE CONTINUO A LER JORNAIS, A OUVIR NOTÍCIAS E A VER DEBATES

A ilusão das redes sociais tende a desvalorizar a informação, embora os seus utilizadores tendam a pensar o contrário. Pelo menos, a grande maioria dos seus utilizadores. A ilusão de que as redes sociais democratizam a informação, uma vez que todos têm acesso a tudo e todos podem partilhar tudo, além de se tratar de uma grande falácia é extremamente perigoso para as democracias, já que cria a ilusão de que é possível viver sem uma informação feita por profissionais, que seja crítica e que nos confronte com outras visões da realidade. Aliás, é curioso – e angustiante, diga-se – a unanimidade que impera nas redes sociais sobre os mais diversos e diferentes assuntos. Pequenos flashs, sem grande profundidade nem esforço de reflexão, que opinam sobre tudo como se fossem verdades absolutas. Pior do que isso, reina uma maledicência destrutiva que se arroga moralmente superior. Vivemos ao ritmo alucinante das redes sociais, enredados pela voracidade da resposta rápida, pouco refletida e amadurecida, apenas pelo desejo de estarmos presentes, de sermos lidos ou vistos. Na verdade, as redes sociais estão a tornar-se uma ditadura dos tempos modernos em que nós nos tornamos escravos por opção.

Pese embora o acesso a várias fontes de informação, continuo a ser – orgulhosamente – um consumidor de notícias, debates e informação paga. Primeiro, porque quero uma informação livre que continue a informar-nos, a dar-nos notícias - tratadas e não a granel –, que nos confronte com diferentes visões da realidade, devidamente fundamentadas, para que dessa forma nós, como cidadãos livres, possamos formar a nossa opinião. Quero que os jornalistas continuem a ir ao encontro da notícia, que vejam com os seus olhos e que ela lhes permita despertar os outros sentidos e, através deles, sentimentos. Que no-lo possam contar questionando a nossa própria visão sobre a realidade e a opinião que temos sobre os acontecimentos. Continuo a ser consumidor de informação, mesmo se às vezes me irrita, porque foi assim que amadureci, que cresci, que continuo a aprender a democracia e, sobretudo, porque não quero viver numa sociedade onde a superficialidade, a maledicência, o boato, o «eu é que sei» e a mediocridade sejam a bitola.

O SILÊNCIO É SINAL DE SABEDORIA

DINHEIRO

Pessoas há neste País a quem não assiste qualquer autoridade moral para se pronunciarem sobre os tempos que se vivem. Sendo verdade que todos nós, enquanto cidadãos, somos de alguma forma responsáveis do estado a que chegamos, não deixa por isso de ser evidente óbvio que outros caberá, pela posição e poder que detinham e detêm, maior responsabilidade e, em alguns casos, diria mesmo culpa. Culpa no sentido de que colocaram os seus interesses acima de qualquer outro interesse coletivo e tendo consciência dos riscos. Por essa e outras razões não têm qualquer autoridade para dizer o que quer que seja sobre os sacrifícios que outros que não eles suportam. Entre outros, incluo os banqueiros neste rol de pessoas em cuja inocência não acredito e que, devido à sua responsabilidade no caos a que chegamos, lhes exijo, no mínimo, a sabedoria do silêncio. São conhecidas várias práticas e atropelos à ética de cidadania (algumas até duvidosas no plano jurídico), tanto de várias instituições conhecidas como dos seus protagonistas. Quanto aos discursos são também conhecidos os arrojos de moralidade com que alguns desses protagonistas às vezes nos brindam. Chego a sentir simpatia, às vezes pena, por tamanha ingenuidade, já que a prática nega à evidência a intenção discursiva. O último desses brindes foram as declarações do Presidente do BPI, Fernando Ulrich. Importa perceber e ter consciência onde fica a linha que separa qualquer ser humano da dignidade a que tem direito. Aguentar todos aguentamos, mesmo que para isso hipotequemos a nossa vida ou a entreguemos de bandeja, mas não será a mesma coisa aguentar perder um carro da alta gama ou aguentar perder o sustento para os filhos, o pão para a boca. Há grandes diferenças e tivessem esses senhores consciência delas que, assim mandaria o bom senso, fariam voto de silêncio em tais matérias. Seria sinal de sabedoria e, caso lhes falte, poderia o silêncio ajudá-los na sua perseguição.

Já várias vezes escrevi que não existe responsabilidade social, por mais que se esforcem, sem consciência social e esta vive-se e pratica-se, em primeiro lugar, intramuros, seja ao nível interno, seja ao nível da comunidade. Não é o discurso que dá forma à responsabilidade social, mas a prática que permite construir o discurso.

Sejam felizes em seara de gente e nunca permitam que vos roubem a dignidade.

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