ALTERNATIVAS: Um caminho sinuoso
Várias têm sido as iniciativas que procuram no debate e confronto de ideias novos caminhos alternativos à política económica actual e ao modelo de desenvolvimento que tem sido seguido. Existem vários problemas nesta procura:
1. Não se pode desenhar uma política económica sem ter claro o modelo de desenvolvimento;
2. Pensar um novo modelo de desenvolvimento, assente em novos paradigmas, é algo exigente e moroso que não depende apenas de cada um dos países, ou seja, apenas de nós;
3. Pressupondo, como hipótese, que estão preenchidas as condições anteriores, há que desejar um programa que seja viável e exequível, faseado no tempo;
4. Finalmente, importa perceber quem serão os executantes desse programa, admitindo que sejam diferentes daqueles que o desenharam.
Facilmente se conclui que esta árdua tarefa é não compatível com a urgência do momento. E, sendo pragmático, o principal problema reside precisamente nesse facto, ou seja, é urgente mudar o rumo. Contudo, a urgência de mudança de agulhas não deve diminuir, também ela urgente, apesar de em grau diferente, a árdua tarefa de médio e longo prazo do desenvolvimento dos quatro primeiros pontos.
Assisti, faz hoje precisamente uma semana, a uma pequena parte da Conferência Economia com Futuro (http://www.economiacomfuturo.org//pages/pt/entrada.php ), uma das iniciativas e tentativa sistemática de reflexão sobre o estado actual das coisas e procura de alternativas credíveis. Sobre o que assisti e ouvi, quero aqui partilhar algumas das questões colocadas pela Prof. Isabel Guerra, comentadora de um dos painéis, pela sua pertinência e pelo grau de interrogação que nos colocam sobre o futuro que pretendemos – ou não – construir.
1. A primeira questão prende-se com os modelos de desenvolvimento alternativos ou a ausência deles. As reflexões que têm sido feitas, baseadas em diagnósticos bem fundamentados, apontam preferencialmente para uma nova regulação dentro do mesmo modelo do que para verdadeiros modelos alternativos. É verdade, como salientaram os intervenientes, que o caminho se faz caminhando e que, chegados a determinado patamar de reflexão, os modelos irão aparecer naturalmente. Por outro lado, e como já foi dito anteriormente, a reflexão é marcada pela ambivalência entre a urgência do momento e a procura de verdadeiras alternativas. Importa sobretudo que os especialistas se libertem do quadro mental e formal que é o seu e que se aventurem por novos caminhos assumindo o risco do erro.
2. A segunda questão tem a ver com o espaço físico do modelo de desenvolvimento, ou seja, qual o local estratégico de um verdadeiro modelo de desenvolvimento alternativo? Tendo nós consciência de que vivemos num mundo globalizado, mesmo que não saibamos ao certo que implicações futuras ele terá, qual será o papel de uma estratégia local e de que modo ela se articulará com um mundo globalizado cuja estratégia nos escapa?
3. A terceira questão é uma das mais fundamentais no modelo de desenvolvimento que pretendemos ou não desenhar. Será possível vivermos numa sociedade sem trabalho? Sem emprego, diria eu, porque o trabalho será sempre fundamental em qualquer sociedade e seja qual for o modelo de desenvolvimento. No modelo actual já tenho falado, desde há quase uma década, nos “produtores passivos”, ou seja, desempregados que, enquanto consumidores, permitem que outros mantenham o seu posto de trabalho, e que haveria que encontrar novas formas de redistribuição de riqueza e novas formas de ocupação. O aparecimento do RMG (actualmente RSI) era, na minha opinião, uma aproximação ao problema. Mas rapidamente se alterou o sentido, atribuindo-lhe uma orientação enganadora, já que o montante atribuído e as normas a cumprir dificilmente permitem a inserção de alguém. Com a agravante de funcionarmos num modelo de desenvolvimento que é profundamente exclusivo, portanto, contrário ao que a medida pretende. É verdade, e há muito que especialistas o dizem, que neste modelo de desenvolvimento se caminha para uma sociedade – e isto apesar do aparente crescimento de riqueza – sem trabalho ou, na melhor das hipóteses, trabalho apenas para uma muito pequena minoria. Portanto, a questão é desenharmos um outro modelo de desenvolvimento, assente em novos paradigmas, em que todos tenham lugar e todas as actividades sejam reconhecidas. Sobretudo passarmos de um modelo especulativo, onde uma restrita minoria se julga com direitos sobre tudo, para um modelo relacional e produtivo, onde as pessoas, as suas necessidades e o seu bem-estar sejam critérios primeiros. Importa redefinir as relações entre trabalho e capital, rompendo com a lógica mercantilista.
4. Quarta e última questão. Como se pode construir uma estratégia alternativa de desenvolvimento alargando o debate a toda a colectividade? A dimensão colectiva é essencial, já que as verdadeiras mudanças não se fazem através de decreto, mas através do envolvimento colectivo nas mudanças. Daí depende o seu sucesso. Para isso é importante que os especialistas nas várias áreas continuem a reflectir e a procurar, mas que, simultaneamente, se preocupem em traduzir isso numa linguagem que todos entendam. Importa não esquecer que muitos dos especialistas das diversas áreas se encontram ligados a universidades e/ou centros de investigação, sendo por isso importante que transformem esses locais em verdadeiros laboratórios de ideias, de pesquisa e de investigação para a procura inovadora de soluções. Esse é o papel nobre das universidades e que, infelizmente em alguns casos, perderam e substituíram pela reprodução e legitimação de lógicas existentes. Os resultados estão à vista!
Ainda uma nota para sublinhar o quanto os partidos – todos eles – se encontram arredados desta reflexão. É verdade que muitos dos seus membros fazem parte dessas iniciativas, mas os partidos enquanto sistemas organizados na procura de alternativas estão muito distantes da realidade. Para bem da democracia é importante que também eles procurem formas alternativas de funcionamento e de relacionamento com os cidadãos.
Sejam felizes em seara de gente.
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