ENGANA-ME QUE EU DEIXO… E NÃO ME QUEIXO

Esta ideia da retoma e da diminuição da taxa de desemprego que o governo anda por aí a distribuir, como quem distribui rebuçados, em nada me adoça a boca e desconfio que alguém esfregou com pimenta as desejadas guloseimas. Há algo que não entendo e que não bate certo, não encaixa. E quando se diz que as pessoas nada sentem ou que essa melhoria não se repercute no seu quotidiana, presumo que isso não aconteça porque se trata de mera realidade virtual, a qual só existe na cabeça dos governantes, seja porque o sonho lhes comanda a vida, seja porque o poder é escudo que esconde a realidade ou, o que é bastante plausível, seja porque a estratégia política assim o exija, com todos os malabarismos e maquiavelismos que ela requer. Falando de emprego, sendo verdade que, segundo as estatísticas, houve uma melhoria significativa, tendo a oferta crescido, entre abril e setembro, em 21,7%, bem como as colocações que tiveram um aumento de 24% no mesmo período, entre setembro e dezembro a oferta teve um decréscimo de cerca de 11,4% e as colocações uma diminuição de cerca de 35,6%, o que significa que as empresas recrutaram menos gente. Baseado nestes dados, tenho dificuldade em perceber como é que a retoma está aí e como é que o desemprego tem diminuído. Como isto da economia e das estatísticas não é para ignorantes como eu, um artigo do Jornal i deu-me uma pequena ajuda. Eis a conclusão: “Perto de um milhão de portugueses trabalhava dez ou menos horas por semana no terceiro trimestre de 2013, um universo que disparou para o dobro de Junho para Setembro, meses em que o total de trabalhadores com empregos de uma a 10 horas semanais passou de 450 mil para 915 mil”. E continua o artigo: “É nestes empregos que reside assim a recuperação do mercado do trabalho que o governo tanto saudou recentemente. Do segundo para o terceiro trimestre do ano, o total de desempregados caiu 50 mil pessoas, o que permitiu ao governo apresentar uma quebra do desemprego de 16,4% para 15,6%. Contudo, nos empregos que exigem mais de 10 horas por semana só houve destruição de postos de trabalho: nos três meses entre o final de Junho e o final de Setembro perderam-se 403,2 mil postos de trabalho que 11 ou mais horas semanais. O aparecimento de mais 464,8 mil trabalhos com horários até 10 horas semanais anulou assim o efeito que aquele ritmo de destruição de empregos teria na taxa de desemprego, conseguindo mesmo baixá-la, servindo também para o governo apresentar os números como sinal do sucesso do programa de ajustamento que superou as piores previsões.” Confesso que ao ler o artigo, da autoria de Filipe Paiva Cardoso, fiquei um pouco mais sereno, não que os dados sejam melhores, mas porque escapei ao autojuízo de ignorante. Afinal, sempre existe alguma explicação para o dito milagre do governo. As coisas nem sempre são o que parecem e, no caso, a baixa do desemprego não é necessariamente uma coisa boa. E nestas contas não entram os mais de 120 mil que emigraram no ano anterior (cerca de 2% da população ativa) e todos os jovens que continuam eternamente de estágio em estágio.

Ontem, assisti a uma pequena parte de um frente a frente entre o deputado José Pureza (BE) e Nuno Melo (PP). Não queria acreditar no que ouvia. Não é que o deputado Nuno Melo teve o desplante de confundir propositadamente e de forma demagógica a emigração por opção com a emigração para a qual atualmente muitos portugueses se veem empurrados?! Ai! Deputado Nuno Melo, emigração por opção felizmente sempre existiu e espero que continue a existir, ou será que o sr. é assim tão novato que ainda não tenha descoberto tal evidência?!. Ou será que os burocratas de Bruxelas lhe vedaram os olhos e corroeram a sua inteligência? O busílis da questão está quando não se tem opção, ou seja, quando se é empurrado para um precipício quando a nossa vontade não seria o suicídio, mas o viver dignamente. Bem sei que também o sr. é um sofredor empurrado pelo seu partido para Bruxelas. Eu sei que teria preferido continuar neste cantinho onde o sol dispensa a ida aos solários ou a ilhas paradisíacas, mas infelizmente não teve opção, obrigaram-no a ir para o inferno do Parlamento Europeu. Apenas lhe posso dizer que se desejar voltar, tem toda a minha solidariedade.

Quando nos dizem que o único futuro possível é o empobrecimento, estão no fundo a dizer-nos para nos conformarmos, aceitarmos o que nos dizem ser inevitável, que percamos qualquer réstia de esperança que em nós ainda habitasse. Resumindo, estão a dizer-nos para desistirmos do sonho, para desistirmos do país. Sendo esse um caminho de derrota, ou pretendem que nos tornemos dóceis escravos ou perderam a noção (se é que algum dia a tiveram!) do verdadeiro significado e sentido da governação.

O problema é que nós deixamos que estes brincalhões com vida alheia continuem a gozar com a nossa inteligência e se julguem os donos de toda e qualquer opinião. Somos enganados, vamos deixando e não nos queixamos.

Sejam felizes em seara de gente, mas cuidado com as ervas daninhas.

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