TANCOS - ARMA DE ARREMESSO CONTRA A DEMOCRACIA

Tancos tornou-se, graças à falta de senso do Ministério Público, arma de arremesso contra a democracia e entrou na campanha eleitoral pela pior das razões, ou seja, no meio do desespero serve como isco da caça ao voto , pretendendo transformar os "julgamentos de tabacaria" em veredicto eleitoral. Quando alguém num período de dias muda assim de opinião e de comportamento, isso diz muito sobre esse alguém e a sua forma de se comportar quando ameaçado. Somos humanos e quando se trata de sobrevivência viramos feras.
Vamos então ao fundamental de tão grande imbróglio, não tanto para os responsáveis políticos, mas sobretudo para as Forças Armadas e para a democracia.
1. Tancos é um assunto grave que merece apurada reflexão? Sem dúvida.
2. Ao Ministério Público cabe a gestão da investigação e dos seus timings? Certamente.
3. Existe responsabilidade política, primeiro do Ministro da tutela e também do Primeiro Ministro? Decorre da própria consciência democrática e da sua vivência.
O cerne do problema e da questão ninguém está interessado em discutir, sendo muito mais fácil atribuir responsabilidades e culpas a este ou àquele. E pouco ou nada tem a ver com a falta de meios como alguns pretenderam fazer crer. O cerne da questão está precisamente no corpo das Forças Armadas, ou seja, a falta de ética, a imoralidade que alguns dos seus membros revelaram. Por isso o assunto é grave e merece profunda reflexão e o apuramento de responsabilidades. E, também por isso, o assunto é tão delicado e exigiria dos principais líderes algum sentido de Estado. Diga-se, em abono da verdade, não ser menos grave o facto de as próprias Forças Armadas se manterem surdas e mudas à espera que o assunto se resolva com o rolar de algumas cabeças. De preferência que sejam de políticos. Pensar que o interesse corporativo se preserva defendendo tudo e todos, mesmo aqueles que o conspurcam, é um mau serviço que se presta não apenas à corporação mas à democracia. Infelizmente, o mesmo acontece com algumas corporações policiais quando alguns dos seus membros pisam o risco ou passam a fronteira do admissível e do que qualquer cidadão deles espera.
Ao Ministério Público cabe gerir a investigação e os seus timings, mas se é verdade que desde Julho que a aquela estava terminada, é justo que sejam feitos alguns reparos:
1. Não seria de mero bom senso escolher um outro momento para a sua divulgação? E os prazos não são argumento válido já que todos sabemos como eles foram ultrapassados em vários processos e nem sempre com uma argumentação convincente. Além disso, pelo que se sabe, poderia tê-lo feito antes do período eleitoral.
2. Caberá ao Ministério Público, para além do apuramento dos factos e recolha da prova, tirar ilações, sempre subjectivas, sobre o comportamento do político A ou do político B?
No que toca à campanha esperaria um outro comportamento de Rui Rio, sobretudo pelo que até agora tinha dito sobre a justiça, os processos e o segredo de justiça. Ficamos a saber que isso apenas é válido no recato do sofá, pois quando se sai à rua a conversa é outra. Quanto à líder do CDS não havia esperar coisa diferente. A forma como desrespeita as instituições democráticas e utiliza um estilo que confunde crítica com ofensa, para além do que foi a campanha para as europeias em que em alguns momentos mais se assemelhava a uma linguagem da direita mais radical, é revelador da ausência de cultura e consciência democráticas.
Finalmente a responsabilidade política, a qual existe sempre em qualquer assunto que ao governo do país diga respeito. Ela é inerente ao exercício das próprias funções e é saudável para a democracia. Quando se confunde culpa com responsabilidade está-se a dar armas àqueles que pretendem criminalizar a política e denegrir as instituições democráticas como forma de ascenderem ao poder. Estas práticas são pouco saudáveis para a democracia. Como pouco saudável é a «palhaçada» do requerimento para a reunião urgente da Comissão Permanente da Assembleia. Em período eleitoral? O que fizeram quando discutiram Tancos e durante as audições?
Aos tribunais o que é dos tribunais ao povo o que é do povo. O julgamento do povo não tem  ver com culpa, mas com responsabilidade.
Por favor, deixem de brincar com a democracia.
Uma última palavra para o Prof. Freitas do Amaral que hoje nos deixou e que, goste-se ou não, nos deu uma verdadeira lição do que significa ser um espírito livre, ou seja, muitas vezes a solidão e abandono daqueles que outrora, por uma ou outra razão, o bajularam. À família e amigos próximos os sentidos pêsames e o reconhecimento do muito que a democracia também lhe deve.
Tentem ser felizes em seara de gente.

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