ESTRATÉGIA DE MORTE ANUNCIADA
1. Parece hoje cada vez mais claro que a estratégia do governo, com a cumplicidade consciente do Presidente da República, passa pelo chumbo de algumas medidas do orçamento pelo Tribunal Constitucional e a afirmação de impotência, por parte do governo,em evitar um segundo resgate ou um programa cautelar. Aliás ninguém neste momento pode prever o que será um programa cautelar, tanto mais que a Irlanda, em condições bastante melhores que as nossas, foi vista pelas entidades europeias como não tendo as condições ideais para beneficiar de um programa cautelar. Também no que à Europa diz respeito, a estratégia dos seus líderes – se é que a têm e se é que o são – é a de nos conduzirem para um abismo do qual dificilmente seremos capazes de escapar. Mas voltemos à realidade deste pequeno quadrado à beira do Atlântico. Este cenário de confronto, mesmo se velado, com o Tribunal Constitucional, parece indiciar a antecipação de eleições e a negociação de um novo programa. Não deixa de ser irónico que, passados três anos, voltemos ao ponto de partida, embora agora com posições invertidas: o PS com a pretensão de subida ao poder e a direita a deixar, de forma inglória, o poder que tanto desejou e que tudo fez para, prematuramente, o assumir. A insistência do Presidente para que os partidos da área da governação cheguem a um entendimento, a um compromisso, mostra claramente como esse é um cenário bastante plausível. O grande problema do Presidente é que há muito perdeu a sua credibilidade e a autoridade que lhe permitissem ser o mentor do processo e, dessa forma,constituir-se como o garante da estabilidade política e da criação de condições para que o País saísse da crise. O Presidente percebeu percebeu demasiado tarde, por incapacidade de leitura da realidade e por partidarismo, as insuficiências,incompetência e falta de maturidade de um governo para fazer face às dificuldades e projetar o futuro. Foi necessário que acontecesse a saída de Gaspar e a birra de Paulo Portas para que o Presidente se desse conta e se confrontasse com uma realidade para a qual ele muito contribuiu. O diálogo entre partidos e entre estes e outros atores políticos e sociais deveria ter sido uma exigência do Presidente desde o início e condição para o empossar de novo governo. E, na verdade, estavam criadas todas as condições para que tal acontecesse. Nunca um governo, em condições tão difíceis, teve condições tão favoráveis para proceder a algumas das mudanças necessárias. Contudo, todo esse potencial foi desbaratado pelo governo com a complacência, quase anuência, do Presidente da República. Assim sendo, descontado o teor emotivo e circunstancial da linguagem, não deixa de ser verdade, como diz Mário Soares, que tanto Presidente como governo estejam a mais, já que nada adiantam, antes pelo contrário, à resolução dos problemas que o país vive. Se enquanto primeiro-ministro Cavaco ficará para sempre ligado à destruição de muito do tecido produtivo do país a troco de milhões da Europa, enquanto Presidente ficará irremediavelmente ligado à incompetência e impreparação de um governo que ele próprio ajudou a colocar no poder e nele o manteve. Em ambos os momentos o País perdeu a oportunidade de fazer as opções que lhe permitissem um desenvolvimento sustentável. Tudo isto aponta para uma estratégia de morte anunciada.
2. Por mais que o ministro Aguiar Branco se esforce em propalar que esta é, sem qualquer ponta de dúvida para o próprio, a melhor solução, tenho alguma dificuldade em compreender o processo dos estaleiros de Viana do Castelo.
- Não percebo como o Estado não encontra 180 milhões para devolver à União Europeia quando encontrou bem mais do que isso para capitalizar a banca. Por outro lado, parece-me não ter sido grande o empenhamento do governo para resolver o problema junto das instâncias europeias.
- Por que razão se levou mais de dois anos a resolver a situação com várias indecisões pelo meio?
- Gostaria também de perceber por que razão, tendo os estaleiros encomendas, as foram perdendo por incumprimento de prazos ou outras razões. Quem foram os responsáveis por essa situação?
- Como é que o Estado vai despender 30 milhões nas indeminizações do despedimento colectivo, quando a renda anual que irá receber ronda os 7 milhões, ou seja, sensivelmente quatro anos para que as rendas paguem as indeminizações? Isto sem contar com os custos do desemprego do 609 trabalhadores para o sistema de Proteção Social e para a Autoridade Tributária (menos impostos) e para a economia local. Será que se continua a governar o Estado como se fosse a mercearia do Sr. Chico?
- Finalmente, será que havia outros interessados? Que razões fundamentaram a escolha?
Enfim, demasiadas incógnitas para um drama que envolve muito mais pessoas do que os 609 trabalhadores. E assim se continua a entregar ao alheio os bens que a todos pertencem. A única estratégia do governo é a de morte anunciada, mas infelizmente é também a morte de todos nós enquanto colectivo.
Sejam felizes em Seara de Gente.
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